|  Os encontros presidenciais podem clarear posições, gerar 
        impulsos políticos e emitir sinais concretos quanto à ação 
        futura a desenvolver entre países parceiros. Isso é oportuno na associação entre Argentina e Brasil, 
        pois é um fato que seu principal instrumento - o Mercosul - tem 
        problemas de credibilidade e, inclusive, gera a sensação 
        de estar à deriva. Daí que seja natural aspirar a definições 
        de alto nível político sobre a sua viabilidade para sustentar 
        a idéia de um horizonte compartilhado de desenvolvimento econômico.
 
 No encontro presidencial bilateral em Brasília, deve ficar nítido 
        o entendimento de continuar impulsionando a aliança estratégica 
        surgida dos pactos fundacionais de 1986 e de 1991. 
 É conveniente que a reunião não seja percebida como 
        uma reiteração de afirmações retóricas, 
        nem como um deslizamento para objetivos políticos sem um avanço 
        correspondente nos compromissos econômicos. 
 É necessário precisar focos e prioridades estratégicas 
        e avançar na qualidade institucional e numa maior flexibilidade 
        operativa. De qualquer sorte, deveria dar lugar a um método de 
        trabalho bilateral que permita gerar impulsos políticos periódicos 
        e sua tradução em ações concretas. A cooperação 
        bilateral tem que se inserir, em imagem e realidade, no contexto institucional 
        do Mercosul, com a adequada consulta e participação dos 
        outros dois parceiros.
 As seguintes são sugestões concretas para fortalecer o 
        Mercosul: 
         Quanto aos focos e prioridades estratégicas de um Mercosul 
          multidimensional, multipolar e de escala sul-americana, é recomendável 
          concentrar-se em quatro pontos que refletiriam vontade política 
          de aprofundar uma associação projetada para o futuro: 
          a) consolidação da democracia e da paz na região 
          sul-americana, que, de imediato, passa prioritariamente pela situação 
          complicada da Venezuela; b) fortalecimento do multilateralismo no plano 
          global, tanto nas questões de paz e segurança, como nas 
          de financiamento e comércio, que passa, de imediato, pelo fortalecimento 
          do papel da Organização das Nações Unidas 
          na questão do Iraque; c) participação conjunta 
          nas negociações comerciais e na preparação 
          para os cenários pós-negociadores, que passa, de imediato, 
          pela apresentação de propostas de negociação 
          e a preparação de requisitos específicos, no marco 
          do Programa de Cooperação Hemisférica de Quito 
          e da oferta de cooperação dos comissários Patten 
          e Lamy, de junho passado; e d) definição de modalidades 
          que tornem viável a incorporação plena do Chile 
          ao Mercosul, através de una flexibilização do instrumento 
          da tarifa externa comum.
 
 Quanto à qualidade institucional do Mercosul, é recomendável 
          concentrar-se em seis pontos que indicariam vontade política 
          de submeter-se a um mínimo de disciplinas coletivas e fortalecer 
          os mecanismos de "criação de consenso": a) forte 
          apoio a uma Secretaria Técnica, que reflita uma visão 
          de conjunto e que, no futuro, seu titular possa ser natural de qualquer 
          parceiro e ser eleito com base em listas tríplices, excluindo 
          o critério de rotação automática de nacionalidades; 
          b) fortalecimento do Grupo Mercado Comum, com reuniões periódicas 
          de coordenadores nacionais em "tempo integral" - como era 
          a idéia original no momento fundacional - e a institucionalização 
          das respectivas Seções Nacionais; c) aperfeiçoamento 
          de métodos de incorporação de normas Mercosul ao 
          direito interno, inclusive a revisão do legalmente vulnerável 
          método de "protocolização na Aladi" como 
          substituto da intervenção parlamentar quando ela for requerida; 
          d) compromisso de ratificar, no curto prazo, o Protocolo de Olivos; 
          e) solicitar à Secretaria Técnica a preparação 
          de propostas a serem consideradas na próxima reunião do 
          Conselho do Mercosul, para agilizar a instrumentação de 
          foros de competitividade, de acordos setoriais de transformação 
          produtiva e exportação (com base na Decisão CMC 
          nº 3/91, ainda em vigor), e do financiamento de empreendimentos 
          conjuntos (com base na experiência do Fundo Europeu de Investimentos, 
          e da cooperação BNDS-BICE); e f) fortalecer a participação 
          real do Foro Consultivo Econômico e Social, e da Comissão 
          Parlamentar Conjunta, como instâncias necessárias do processo 
          de decisão conjunta, e aumentar a transparência dos processos 
          de decisão, publicando no site do Mercosul todos os anexos das 
          atas de reuniões e os projetos sob consideração 
          dos órgãos.
 
Quanto à flexibilidade operativa do Mercosul, é recomendável 
          concentrar-se prioritariamente na questão da tarifa externa comum 
          - que indicaria uma vontade política de atuar com pragmatismo. Não é conveniente a repetida recolocação 
        da união aduaneira, levando em conta os problemas legais e de credibilidade 
        internacional que isto implica. A idéia a instalar é a de uma união aduaneira, a 
        um só tempo flexível e previsível. Para isso, seria 
        preciso acertar o critério de uma tarifa externa comum de geometria 
        variável e múltiplas velocidades, na qual a flexibilidade 
        esteja pautada desde o início e se prevejam válvulas de 
        escape temporárias para situações especiais.
 
 Tal enfoque, durante um período de transição de dez 
        anos, seria compatível com a ambigüidade saxônica do 
        artigo XXIV-8 do GATT-1994 e permitiria encontrar uma modalidade prática 
        de incorporação plena do Chile.
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